segunda-feira, 8 de novembro de 2010
Sobre o tempo e sua areia movediça
Sem grande medo de ser reducionista, pois a poética nos dá o aval inclusive para ilusões desmedidas, vemos que há pessoas que são apaixonadas pela obviedade e outras pela mudança.
Os apaixonados por mudanças têm os calcanhares chafurdados nas areias da praia e com a ponta do dedão fazem circunvoluções nessas pequenas granulações que são destino moído, lembrando um movimento Sísifico de rolar sua pedra. Outra característica marcante nesses serezinhos tragicômicos é a alma teatral, mas trataremos disso em instantes.
Os apaixonados pela obviedade são aqueles que na praia olham o mar.
Eles levam embaixo do braço enciclopédias de belas e fatigantes palavras já ditas sobre as ondas, colecionadores engessados que são de almanaques e de amores passados.
Não é que aqueles imensos olhos azuis de ressaca não mereçam respeito, mas os rótulos e toda poesia afogada de métrica contaminam suas águas.
A náusea que causam os clichês esconde em si uma náusea muito maior: O nosso medo de olhar para o que é relativamente infinito. Temos pavor de ver a imensidão pela fechadura, anjos inconformados que somos.
Criamos então os arquétipos que são pedaços destronados daquilo que é muito amplo. Estes pedaços nos dão terra familiar, firme e superficial.
Voltemos, porém, aos apaixonados por mudanças (já que a poética nos permite até uma dose rasa de egocentrismo.)
A paixão pela mudança não é a paixão pela mudança, é, na realidade, uma ânsia por não morrer.
A vontade terrível de prender os ponteiros do relógio entre os dedos e cravar as unhas nos segundos, aquela ânsia irrevogável de ser Desdêmona , Lady Macbeth, Ofélia em um mesmo leque de uma mesma ventania.
E o que nos fere é saber que a areia da ampulheta é movediça - Ah , nem os amantes do imprevisível sabem o poder dessa areia movediça- e que uma vida só cabe dentro dela como aquário invejoso que olha para piscina .
E é aqui que entram, nadando de costas, as almas que sendo apaixonadas por mudanças, o são também pelo teatro. Atores são bonecas russas da condição humana: Têm dentro de si muitos outros. Eles driblam o tempo, driblam a “indesejável das gentes”.
Enquanto vamos engolindo os instantes, eles vão encaixando vidas e têm o grande privilégio de morrer nos palcos todos os dias e nas matinês aos sábados.
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